segunda-feira, 25 de junho de 2007

Alegorias do Barroco



O CCBB está apresentando uma exposição sobre o Aleijadinho. A mostra traz os santos, frisas em baixo relevo e as réplicas dos Profetas da Igreja de Matosinhos. Claro que o acervo só poderia ser ilustrado pelos versos eternos do ‘Romanceiro da Inconfidência’, de Cecília Meireles. Romanceiro é uma forma literária da tradição oral, poema para ser cantado ou contado de geração em geração. O de Cecília é o maior poema da literatura brasileira, com 85 ‘romances épicos’, em que ela nos conta, em versos cadenciados, a odisséia do herói Tiradentes e seus companheiros. A época é o fim do século XVII, quando teve lugar o ciclo do ouro nas Minas Gerais de Ouro Preto e seu Rio das Mortes. Ouro sempre despertou cobiça e propiciou o estabelecimento de comarcas e distritos, dos quais o centro era Vila Rica. Minas deve seu nome e seu progresso ao ouro. Lá tambem se deu a grande conspiração de 1789, a Inconfidência Mineira.
Que a sede de ouro é sem cura,e, por ela subjugados,os homens matam-se e morrem,ficam mortos, mas não fartos.todos pedem ouro e prata,e estendem punhos severos,mas vão sendo fabricadasmuitas algemas de ferro.
O escultor, arquiteto e entalhista Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, nasceu em Vila Rica, atual Ouro Preto. Ele criou com suas mãos carcomidas um tesouro de ‘fé, engenho e arte’ - título da exposição de obras barrocas de Minas. A arte barroca originou-se na Itália e atingiu outros países da Europa. Chegou à America juntamente com os colonizadores portugueses e espanhóis. Nela, as emoções se contrapõem ao racionalismo renascentista. O estilo barroco traduz a tentativa angustiante de conciliar forças antagônicas: bem e mal; Deus e Diabo; céu e terra; pureza e pecado; alegria e tristeza; paganismo e cristianismo; espírito e matéria, razão e emoção. Os efeitos decorativos e visuais são dados por curvas, contracurvas, espirais, colunas retorcidas; entrelaçamento entre a arquitetura e escultura e acentuados contrastes de luz e sombra:
Anjos e Santos nascendoem mãos de gangrena e lepra- todos os sonhos barrocosdeslizando pelas pedras.
O romanceiro de Cecilia jamais foi excedido por obra que se lhe pudesse comparar, assim como a arte do Aleijadinho jamais foi excedida, embora muito imitada. Visitar Ouro Preto é uma viagem indispensável a nosso glorioso passado. Ruas de ferro, becos, museus e igrejas são percorridos com admiração por turistas brasileiros e estrangeiros. O intenso trânsito de carros e caminhões, mais a proliferação de barracas, vem descacterizando a cidade e perturbando sua solene imponência. Vandalismo e roubos têm impedido o acesso às igrejas, a nâo ser em determinados horários. Não obstante os mafuás, a cidade se mantém como testemunha eloqüente desse conturbado e rico período da história do Brasil.
Sobre o tempo vem mais tempo.mandam sempre os que são grandes:e é grandeza de ministrosroubar hoje como dantesvão-se as minas nos naviospela terra despojada,ficam lágrimas e sangue.
O dia 21 de abril é consagrado à memoria de Tiradentes, a lendária figura que Cecília imortalizou. O Romanceiro acaba de ganhar magnífica edição de luxo, com apresentação de Ana Maria Machado e ilustrações de Renina Katz. O enredo fala de traição, de figuras embuçadas, de cobiça, reuniões noturnas, mas fala principalmente do sonho de liberdade que animava o Alferes e os Inconfidentes.Ai, palavras, ai, palavras,que estranha potência, a vossa!Perdão, podíeis ter sido!- sois madeira que se corta,- sois vinte degraus de escada,- sois um pedaço de corda…- sois povo pelas janelas,cortejo, bandeiras, tropa…Ai, palavras, ai, palavras,que estranha potência, a vossa!Éreis um sopro na aragem…- sois um homem que se enforca!
Para o escritor Joel Neves, em “Idéias Filosóficas no Barroco Mineiro”, “A forma barroca vem inaugurar uma exigência não apenas no campo estrito da arte, mas igualmente uma nova postura face à racionalidade. Preferimos compreender o barroco como inaugurador e não como resultante de uma causalidade que em si contivesse, já formalizadas, as teorizações de uma possível mudança de enfoque da razão. Sem dúvida, o barroco é uma nova concepção de mundo, de homem, o gérmen de uma nova concepção de razão” … “O ilusionismo barroco é efeito da virtuosidade do artista, revelando o poder de transformar a realidade no irreal, o irreal em realidade, o limitado no ilimitado, o orgânico em inorgânico. Daí o período barroco ter se caracterizado pelo exibicionismo do poder - o absolutismo - por uma unidade abrangente de todos os fenômentos contraditórios: o limitado convivendo com o ilimitado; o formal lado a lado com o informal; o simétrico e o assimétrico em um mesmo campo; naturalismo e anti-naturalismo em íntimo conluío”.
Paulo Mendes Campos dizia que somos ‘mineirinhos por fora e barroquinhos por dentro’… Até há pouco tempo, Tiradentes ‘era’ nosso herói máximo, mas hoje já se discute se… Mas que ele era barroco, isso ninguém pode negar! Quando visitamos Ouro Preto, temos a certeza de que Deus também é mineiro e barroco, e que o Aleijadinho é o seu profeta.


Tekka Whitman

Um comentário:

Tekka disse...

MLucia

que show este seu novo blog!

deixo gde abraço, tekka