sexta-feira, 10 de abril de 2009

Blade Runner


"Entramos no cinema e descobrimos, numa cidade do futuro - não tão distante - uma experimentação de montagem de um novo território do desejo. É Riddley Scott que nos introduz a esse mundo, em seu filme Blade Runner. Nele somos apresentados aos "replicantes": robôs programados para colonizar o espaço. Perfeitas réplicas do homem, eles só não estão equipados para produzir réplicas emocionais ( isso só atrapalharia sua livre circulação pelos planetas, indispensável ao cumprimento de sua tarefa). São réplicas sim - mas das máquinas celibatárias, em seu máximo aperfeiçoamento.
Mas isso não é assim tão tranquilo para eles: quando está por expirar seu prazo de existência, rebelam-se. Replicam. No começo do filme, eles acabam de voltar à Terra justamente para subverter esse seu destino. Querem desertar sua condição de desalmados: já pressentem essas faixas de frequência para as quais o homem, seu criador, negou-se deliberadamente a equipá-los. Atacam a empresa de seu criador: querem viver. Mas a vida já não pode ser para eles - seu destino é fatal. Sua revolta só vingará se contaminar os homens.
Ficamos na esperança - talvez ingênua - de que os replicantes inventarão outra espécie de amor. Ficamos sonhando com a possibilidade de... uma outra cena? um outro mito? Um amor não tão demasiadamente humano. Montagens desintoxicadas do vício de redução do desejo de mundo a um objeto-pessoa ou uma pessoa-objeto. Ficamos imaginando um além do homem (humano e/ou desumano), onde campos de intimidade se instaurem. Uma certa inocência... Um além do espelho, onde o outro não seja mais aquilo que delineia nosso contorno. Uma nova viagem, uma viagem solitária: uma solidão povoada pelos encontros com o irredutívelmente outro.
Mas como seria essa viagem? Quase replicantes que somos, já sabemos também de que é feito esse empenho. Faz muito tempo que fomos contaminados pelo segredo de Roy, replicante chefe.
O empenho é pelo amor. O empenho é feito de amor. Mas, por enquanto, pouco ou nada sabemos acerca dessa espécie de amor. Afinal, esse é apenas o primeiro encontro entre um homem-quase-replicante e uma replicante-quase humana."
Texto da escritora
Suely Rolnik

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Vida e Morte

No sabor das recordações
Vida e Morte
- em retrospectiva -
Fazem o jogo de tudo ou nada.
Companheiras de solidão
Procuram por seus fantasmas
Disputando na surdina
Os lances limítrofes da existência.
Como numa moeda
- verso e reverso -
São parceiras inseparáveis
Porém coladas que são,
Se uma põe, a outra dispõe.

Maria Lúcia de Almeida

terça-feira, 7 de abril de 2009

Vestígios


Desce o poente
Na tarde vazia
Vão prateado
Da noite sem cor.

Em nuvens pesadas
E na penumbra sombria
Fácil é sentir-se perdido e só.

Por uma vida tola em que se omite
Por sonhos sempre desfeitos
Por quem chora ou já chorou.

Tudo o que hoje é presente
Se transformará em lembrança
Em versos simples...
Nos vestígios de um poeta.

Maria Lucia de Almeida

sexta-feira, 3 de abril de 2009

A carta que eu queria ter escrito...




Se um dia
Sentir-se muito cansaço,
Cansado de tudo
Cansado do nada
Abra a cortina do alvorecer
E deixe cair estrelas no gramado.

Namore a lua que surge mais tarde
Desvende caminhos no cheiro da noite
Recorde os tantos lugares visitados
Vislumbre os que ainda sonha conhecer.

Sinta no corpo a leveza do vento
O frescor das primeiras chuvas
E a gostosa sensação do arrepio.

Lembre-se do perfume das tardes da infância
Do aconchego das velhas amizades
Do tesão de todos os amores
Da magia de cada amanhecer.

E lembre-se mais...
Basta que você queira
E tudo acontece novamente:
No ser, pelo ser, para o ser
Nesse nosso lindo viver.

Então, por favor, meu irmão
Dê uma nova chance a você!

Maria Lucia de Almeida