segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Natal



É noite de natal, entre um abraço e um presente
para e penso
Nos homens, nas mulheres, nesta multidão
Na ânsia de um andar , num caminhar intenso
Penso na tristeza de um mundo tão vazio
Penso no boêmio, no pobre, no mendigo
Nas tolas brigas, nos abraços e nos inimigos.
Nas longas dores de sentir tamanha fome,
Nas chaga que agoniza e mata, e que consome.
Penso na fúria e na revolta do assassino,
No choro indefeso e grave do menino,
Na dor que é viver, que é ser gente.

Maria Lucia de Almeida

domingo, 21 de dezembro de 2008

Entre o real e o imaginário



E, afinal, o que é a ilusão?
Uma velhinha que pinta o rosto de batom e rouge quando vem para acalçada tomar sol ?
A televisão que apresenta os filmes americanos, franceses, alemães, todos dublados em português?
O ourives que constroi anéis com pedras falsas?
A mão que blefa a cartada decisiva num jogo de pôquer?
Os ardís e as várias línguas e linguagens do amor?
Neste mundo em que a repetição de nomes acaba por fazer a 'interposição' de pessoas, de dublês de corpos, quem seria a Maria original?
O simulacro produz o efeito da verdade.
E assim como os olhos da figura mitológica da Meduza podem petrificar quem os contempla,
muitas vezes não se pode olhar a verdade de frente, e todos que sofrem a ação da mentira, quanto os que a inventam, defendem-se dos efeitos devastadores da verdade injetando em si próprios, regularmente, doses de ilusão.
Assim segue a vida...criando momentos em que o real, o simbólico e o imaginário são um único buraco.


Maria Lúcia

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

O tempo e a fonte





A água de ontem e a água de hoje
- Entre o passado, o momento presente e o que virá -
O instante que nos enlaça.

Maria Lúcia de Almeida

domingo, 14 de dezembro de 2008

Um momento de magia



Depois de uma longa subida, a mulher dá sinais de fadiga.
Faz uma pausa para um momento de contemplação, e pondera, calmamente, a sua escolha dentre as muitas direções.
Sob uma lua cheia, numa paisagem ao mesmo tempo clara e escura, o que existe é apenas uma mulher com medo. Estranhamente, ela se lembra das histórias infantis, de uma bruxa má que prega peças cruéis em quem se perde na noite.
Do outro lado de um fosso de águas túrgidas, talvez habitado por coisas que metem medo, vê os torrões de um castelo. Mas a ponte está elevada, os portões estão fechados, e parece que ninguém escuta seus lamentos.
- Será que a magia da bruxa má barrou o caminho de volta pra casa? ,  Questiona a mulher.
A lua surge por detrás das nuvens, ainda mais clara e, de repente, parece mais quente e insinuante.
No pálido rosto da mulher escorrem lágrimas, enquanto o chão parece crescer , ultrapassar o fosso e a muralha que cerca o castelo. Foi feito o contato.
Uma estrela de esperança e assombro brilha no céu. Uma sensação de milagre anuncia que novamente os sonhos podem se realizar.
A mulher vê agora, claramente, o caminho de volta para a casa. Agradece a lua, segue em direção.
Maria Lucia

domingo, 30 de novembro de 2008

Um ano sem sentido


"Lembrem de mim como de um que ouvia a chuva
Como quem assiste a missa
Como quem hesita,
mestiça,
Entre a pressa e a preguiça.
Acordei bemol...
Tudo estava sustenido...
Sol fazia...
Só não fazia sentido..."

Paulo Leminski

sábado, 15 de novembro de 2008

O vento (Quintana)






No fim tu hás de ver que as coisas mais leves são as únicas
que o vento não conseguiu levar:
um estribilho antigo
um carinho no momento preciso
o folhear de um livro de poemas
o cheiro que tinha um dia o próprio vento.

sábado, 4 de outubro de 2008

No silêncio


"E mais de uma vez
quando eu estava sozinha
revolvendo dentro de mim
a palavra que é o símbolo de mim mesma,
o limite mortal do próprio eu se perdeu
e passou ao inominado...
como uma nuvem se dissolve no céu."


('The ancient Sage")

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

HAICAI


Coberto de negro,
o morcego descobre-se
no branco do olho.

Chris Herrmann

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Sem Questionamento


Não me perguntem quantos anos tenho
Não me perguntem quantos anos faço
Meus caminhos começam
além da margem de lá, depois da curva do rio
entre pedras e cachoeiras,
entre esmeraldas, futuro e taquarais.
Que não lhe impressionem a cor gasta de meus cabelos,
nem estes olhos fundos, fundos e profundos,
e a pele que em rugas guarda os segredos que vivi.
Não me perguntem quantos anos faço.
Perguntem-se que canções canto, que poemas leio,
que histórias escrevo.
Perguntem-me quem se aquece em meu braço febril,
quem se alimenta de meus beijos,
quem se apoia em minhas mãos cansadas.
Perguntem-me pelos portos que me aguardam,
pelas emoções que vivo,
pelos caminhos que surgem de meus devaneios.
Perguntem-me pelos clichês que desconstrui,
pelas transgressões que empreendi,
pelos horizontes que ultrapassei.
E quando me virem caminhando assim
entre silêncios e pensares,
olhar distante numa falsa abstração,
apontem-me como alguém que ainda ama,
sonha, luta, espera e crê.
Então, só então, digam:
ali vai uma jovem, para quem todo amanhecer
é sempre inaugural porque acredita
que enquanto houver vida,
não haverá ponto final.
Arlete Parrilha Sendra
(Membro da Academia Campista de Letras)

domingo, 22 de junho de 2008

Reverso do espelho


Pela estrada do tempo
Misturamos as horas no caminho
Túnel magico de lembranças em múltiplas formas
Minha alma se comove com as imagens
Meus sentidos se expandem com o vento
Apaziguante sensação de unicidade.

Sede de vida em cor lilás:
Todas as pessoas nascem
Todas as pessoas morrem
Todas as pessoas são viajantes
Dessa mesma estrada.

Fios de braços entrelaçados,
Formamos o todo.
As marcas permanecem através do tempo
E assistem a nossa passagem
Como um reverso do espelho.

Maria Lúcia de Almeida

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Nas tardes, sempre.


É nas tardes
Que me refaço
Em cores e sombras,
No canto dos pássaros.
É nas tardes
Que me refaço
Em vários perfumes,
Em lembranças e flores,
Numa doce mistura:
Presente e passado.

Maria Lúcia de Almeida

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Satélite


Fim de tarde.
No céu plúmbeo
A Lua baça
Paira
Muito cosmograficamente
Satélite.
Desmetaforizada,
Desmitificada,
Despojada do velho segredo de melancolia,
Não é agora o golfão de cismas,
O astro dos loucos e dos enamorados.
Mas tão-somente
Satélite.
Ah Lua deste fim de tarde,
Demissionária de atribuições românticas,
Sem show para as disponibilidades sentimentais!
Fatigado de mais-valia,
Gosto de ti assim:
Coisa em si,
- Satélite.

Manoel Bandeira

sexta-feira, 23 de maio de 2008

A melhor parte de mim


De tudo que sei e vejo:
Não sei!
Não sei olhar a vida e não me emocionar...
Choro pelo belo que vejo,
Choro diante da perplexidade...
Rio de mim e por mim.
Procuro incessantemente descobrir quem sou
E parecer comigo...
Choro por mim,
Rio na mesma intensidade.
Não sou alegre nem triste,
Sou.
Vasculho sótãos e porões da minha alma:
Não esqueço, aqueço.
Minhas memórias são sempre-vivas.
Sou aquela que não pensa, vive.
Vivo de amor, poesia e brisa...
Sou quem, por ora, me habita.
"Sou o que vejo!"
E como vejo coisas "demais",
procuro ver bem tudo que gosto.
Espalho o que gosto de ver por todos os lugares e cantos...
para que eu possa, sempre, me lembrar quem sou.
Esta é uma das coisas que gosto de ver bem ...
Alberto Caeiro

domingo, 2 de março de 2008

Canção Mínima ( de minha poetisa predileta)




No mistério do sem-fim
Equilibra um planeta.
E, no planeta, um jardim
E, no fardim, um canteiro
No canteiro uma violeta
E, sobre ela, o dia inteiro
Entre o planeta e o sem-fim,
A asa de uma borboleta.

Cecília Meireles

Vitrine



Pelas frestas de seus olhos
Posso ver anjos sorrindo
Posso tocar luas que nascem
Por entre vales escuros.

Por entre becos sem fim
Alamedas de saudades
São pedaços de mil mundos
Dispersos dentro de mim.

E me perco nos seus olhos
Desvendando seus mistérios
Eu - vendo minha alma nua -
Na transparência dessa vitrine.

Maria Lucia de Almeida

sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Centelha





Se penso
E repenso
Nada acontece
Alma permanece no escuro.
Mas quando me sinto
- Logo existo -
Centelha de luz
Que me escolhe,
Isola,
Identifica,
Entre os seres do mundo.

Maria Lúcia de Almeida

sábado, 26 de janeiro de 2008

Viva!!!





Quando a saudade apertar
Quando a tristeza surgir
Quando a alegria desaparecer
Quando o vazio chegar
Abra a porta, a janela
Abra o mundo para a vida entrar.

Quando o corpo tremer
Quando o soluço gritar
Quando a lágrima cair
Quando sentir-se sacudida pelos soluços
Não se feche, não se desespere
Permita que reconheça
Que além de sorrir, você sabe chorar.

Quando despontar o dia
Ao invés de chorar, sorria
Quando o crepúsculo chegar
Quando a lua surgir
Quando a primeira estrela brilhar
Pare um pouco seus pensamentos,
E aprenda a sonhar.

Quando sentir-se sozinha em meio a multidão
Esqueça o medo que tinha
De um dia chegar a solidão
E viva a vida calmamente
Como se tudo fosse fantasia
Como se somente existisse utopia
E viva...com alegria.

Quando a realidade chegar
E as cores se transformarem em nada
Não se esqueça de lembrar
Que tudo faz parte da vida
Tudo a completa...
E viva!!!

sábado, 12 de janeiro de 2008

Flores Tristes






"Existia na Ásia as "Flores Tristes",
as quais foram dotadas o nome de "estrelas perdidas".
É uma antiga lenda, segundo a qual, essas flores são
estrelas que se perderam durante a noite e caíram na terra.
O comovente é que seus ramos longos e frios parecem atirar-se
inutilmente do espaço para a liberdade perdida.
Como os homens: cada um de nós perdeu, irremediavelmente,
alguma coisa na vida...
Um caminho, uma esperança, uma felicidade."

Anônimo.

sábado, 5 de janeiro de 2008

Belo Horizonte



Como vai BH?
Ouve a voz da montanha
Como vai?
Sei de cor meu lugar
Belo Horizonte
Quando cai a tarde em meu coração
Liberdade a praça das paixões

Se distante a saudade quer chegar
Quem feriu a linda serra do curral
Luz da lua apareceu
Como se fosse sonho meu
Como se fosse bom

Manacá como vai?
Dama da noite como vai?
Sei de cor meu lugar
Salve a floresta
Vem andar no prado – Cidade jardim
Hoje é festa na dor das capitais
Nas cinzas dos quintais

Se entreguei meu coração num dia assim
Li seu nome na palmeira imperial
Encantado descobri
Flor de minas
Bem ou mal.

Flávio Venturini