Assim como crescem as ervas daninhas, crescem nossas expectativas amorosas a respeito do outro. Criamos idéias ou ideais amorosos a partir de fantasmas que circulam por nossos sonhos, nossas fantasias e, feito sonâmbulos, viajamos em poemas, filmes, músicas e cartas amorosas, romanceando uma realidade que não existe a não ser em nossa ‘particular’ loucura. Não nos apercebemos do ridículo de nossas ações e nem que as situações se tornam clichês a cada troca de identidade, pois ao nos identificarmos com o outro, perdemos a nossa própria. Sufocados pela rotina, insistentemente buscamos, até mesmo no passado, o nosso ‘sonho de amor’ que, se por algum motivo,esse passado retorna ao presente, acaba por criar uma situação ‘nonsense’, ou seja: " Foi mesmo por esta criatura que me apaixonei um dia?"...
E daí tudo se explode! Fantasias, expectativas e belas lembranças daquele ‘sonho de amor’ desaparecem pelos ares.
Paixão esse sentimento quase mágico que todos querem experimentar, mas que ninguém sabe muito bem explicar é tema do filme Ervas Daninhas (Les Herbes Folles) do cineasta e um dos precursores da Nouvelle Vague, Alain Resnais. O diretor retrata com muita ironia e humor esses impulsos românticos ou obsessões amorosas provindas da paixão. A facilidade com que "todos dizem eu te amo" vira, nas mãos de Resnais, material para comédia afiada. O enredo quase surreal e divertido dirigido por Resnais não chega a ser uma obra prima do cinema, mas provoca e brinca com o público ao se revelar uma deliciosa metáfora das ‘divagações’ dos seres humanos apaixonados que caminham, assim como no filme, para um final dramático, muito doido (e doído), mas bastante divertido. Dificilmente nos enganamos em se tratando de paixão, o núcleo de nossas vidas e de nosso ser desloca-se para o objeto da paixão; os defeitos da ‘vítima’ de nossa paixão esmaecem ou desaparecem definitivamente; a bioquímica de nosso corpo se transforma e nos transforma, o que provoca suspiros, perda de concentração, enfim: o caos se instala! Há várias expressões que falam da inevitabilidade da paixão e de como somos por ela tomados: em inglês, ‘to fall in love’, em francês ‘tomber amoureux’, em suma, a paixão é uma queda, um salto no abismo. O destino da paixão, assim como bem retrata Resnais em seu filme, só pode mesmo ser a tragédia.
Porém, se alguma paixão em sua vida deu certo é porque você abriu mão dela e começou a percorrer os caminhos do amor. O amor é fruto de uma lenta construção, uma construção elaborada ao longo do tempo e da convivência. O amor ao contrário da paixão não exige arroubos e suporta oscilações, quedas, atrasos e períodos de baixa. O amor é um estado de espírito, geralmente traduzido por calma, relaxamento e tranqüilidade. Creio que não devemos generalizar nossa carência e nem fazer dela um filme como o de Alain Resnais. Devemos sim, fazer um balanço de perdas e danos e escolher acreditar no amor, pois essa crença pode, e muito, felicitar a nossa vida.
Maria Lúcia de Almeida
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