domingo, 27 de julho de 2025

O tempo e o Vento

 " O vento que leva o que amamos é o mesmo vento que traz coisas que aprendemos a amar."


O Tempo e o Vento

Há dias em que o vento sopra como quem sussurra memórias. Ele vem leve, quase tímido, brincando com as cortinas, espalhando folhas na calçada, como se quisesse nos lembrar que tudo passa, até o instante mais eterno. 
O vento é, talvez, o mensageiro mais fiel do tempo. Não o tempo do relógio, com seus ponteiros apressados, mas o outro, aquele que sentimos na pele, nos olhos, no silêncio que cresce nas pausas entre as palavras. 
Hoje, por exemplo, o vento passou por mim com cheiro de infância. Trouxe o som de risadas correndo soltas no quintal da casa, o gosto do doce de leite ainda quente, o grito da mãe chamando pra dentro quando o céu começava a escurecer. E, por um instante, eu voltei sem sair do lugar. 
É isso que o tempo faz quando caminha de mãos dadas com o vento: dobra as esquinas da memória e nos convida a sentar no banco das lembranças. Mas o vento também carrega o tempo que ainda não chegou. Sopra no rosto como promessa. Leva embora o que pesa, espalha o que já não serve, como quem varre a alma. E há beleza nisso, nessa faxina invisível que ele faz. 
O tempo e o vento são irmãos antigos. Um molda, o outro move. O tempo constrói histórias e o vento as espalha. Juntos, eles nos fazem entender que a vida não é feita para ser controlada, mas sentida, assim como a brisa que passa e nos arrepia sem sabermos exatamente por quê. E quando nos damos conta, já estamos vivendo outro momento. Outro sopro. Outro tempo.

Maria Lucia de Almeida

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